Tão lindo amanheceu o sábado. Depois de uma noite de sono meio estranha, com dificuldades para dormir em função das quatros horas a mais de fuso na Noruega, caí da cama – cara, mas muito boa. Apesar do sol, Tromso amanheceu branquinha e escorregadia, como comprovei algumas vezes durante o dia.
Amanhecer em Tromso
Mas não foi um dia com cara de férias e descanso. Como eu deixei para reservar os hotéis de ultima hora, não consegui marcar as três noites seguidas em um mesmo lugar. Por isso, tive de fazer o check out até meio-dia em um e depois ficar dando banda de mochila ate a hora do check in em outro, as 15h. Atravessei a ponte da cidade para conferir o cable car, que, dizem, dá uma bela visão da cidade. Por ali também fica a Arctic Cathedral. A igreja estava fechada, o cable car, em manutenção até maio. Começaram os azares do dia.
Consegui me proteger bem do frio, de maneira geral, exceto o rosto e o pequeno nariz, e eu fiquei com essa carinha de rena do nariz vermelho.
O frio queima mesmo, sabe?
Depois de uma cochilada no novo hotel, acordei para a expedição que eu tinha agendado do Brasil para ver a aurora boreal. Como as luzes da cidade dificultam que a gente a veja, guias nos levam de bus até pontos afastados – e frios, bem frios – para tentar enxergá-la. But, Houston, we have a problem. Apesar de haver previsão de atividade moderada das tais luzes do norte, o tempo fechou e, com céu nublado, muito pouco se vê. Ou nada, como aconteceu, apesar de termos passado a noite rodando atrás de lugares com céu mais claro. Fomos até a fronteira com a Finlândia. Nada, a não ser escuridão e um frio de doer. Não consegui ficar muito tempo fora do ônibus, porque comecei a deixar de sentir os pés lá pelas tantas.
Frustrada, voltei para o hotel, mas decidida a repensar a vida. Só tinha mais uma noite em Tromso e, por fim, toda essa ideia doida de se meter onde o Diabo perdeu as botas tem um único motivo: ver a aurora. Mas e a grana pra ficar mais três noites onde todos os hotéis custam um rim? E para fazer mais dessas excursões? Mandei às favas. O cartão de crédito que me salve, em último caso, e comprometo o outro rim no IOF. Faz parte.
Depois de passar o dia cancelando reservas em hostel, remarcando passagem aérea e renovando pedidos de couchsurfing pelo site para tentar baratear a viagem, dei uma passada na agência da expedição para conferir a atividade da aurora para o dia, que não apenas seguia nublado, mas com muita queda de neve.
“A aurora está numa atividade quase anormal”, me disse o cara da agência. “Embora esteja nublado, é bem provável que se veja algo. Se tivesse céu totalmente claro, se poderia ver aqui da cidade mesmo, ali na rua”.
Achei que era papo. Disse que ia até o hotel e de lá decidiria o que fazer. E aí, catando na internet os sites de forecast, dei de cara com a palavra HIGH. Em caps lock e vermelho. Ok, não precisava mais pensar.
No caminho, os guias foram nos atualizando da atividade da aurora, que tem uma medida que vai de 1 a 10. Estava em 9,5, o que um deles classificou de “brutal activity”.
No local onde paramos para observar, estava totalmente nublado, mas havia previsão de limpar a partir das 21h. Câmera no tripé, ajustes manuais de abertura, exposição e foco feitos, tentava olhar para o céu, mas a neve caía forte nesse momento e entrava direto no meu olho. Quando, mais uma vez, deixei de sentir meus pés, resolvi que entraria no ônibus um bocado, para aquecer um pouquinho antes de voltar à jornada de São Tomé. Nesse instante, os guias estavam mesmo começando a servir chocolate quente e uns biscoitos. É bom, mas não duvidem, também extremamente complicado. As mãos realmente congelam na tirada das luvas para fazer qualquer coisa.
Entre um chocolate quente e outro, saltou do ônibus um dos guias:
“Guys! Northern lights, northern ligths over there!”
Minha “primeira” aurora
E todo mundo correu para o outro lado. Ela começou em pequenas linhas verdes no céu, nada sinuosas, quase invisíveis. Apesar da atividade intensa, ela não veio com força a maior parte do tempo. Ainda assim, quando os clarões verdes mais fortes se manifestaram, borrando o céu inadvertidamente, eu não segurei a onda. Chorei mesmo.
Provavelmente me arrisque de novo em outra expedição para tentar ver as “luzes do norte”. Se as previsões forem boas, claro. Principalmente na terça-feira, dia de alcançar os 33 anos. Idade do juízo e de “sossegar o facho”, como pede minha mãe? Acho que não.
Nessa hora, ate esqueci do frio nos pes
P.S.: o adaptador que eu trouxe nao serve para as tomadas da Noruega, entao estou sem usar meu proprio note. Sorry pela falta bizarra de acentos (comprei nessa segunda-feira um adaptador e arrumei o texto)
P.S.: momento de terror e pânico: entrei no ônibus e não encontrava de jeito nenhum minha bolsinha com grana, passaporte, cartões, enfim, tudo de importante para minha sobrevivência. Avisei um dos guias, desci do bus e fui correndo na agência e perguntei se tinham visto algo. Lá estava ela, paradinha em um dos balcões. Noruega, minha gente, Noruega.